O
HOMEM QUE NÃO TINHA MEDO
José
Edimar
Comentários
sobre o medo
Ouvi
demais no sertão,
Que
medo nunca existiu
Era
mais uma invenção,
Assim
eu cresci pensando
Que
medo fosse ilusão.
Ouvi
com muita atenção
O
que um sábio dizia,
Que
dentro do universo
Muita
coisa estranha havia,
Que
nem sequer imagina
Nossa
vã filosofia.
Fui
procurar meu avô
Pra
desmanchar esse enredo,
Perguntei
sobre o assunto
Ele
não me fez segredo,
Me
falou e garantiu:
"Tudo
que tem "c" tem medo".
01
O
medo tem um sintoma
Que
ninguém pode entender,
Não
existe horário certo
Para
o medo acontecer,
Já
fez medroso subir
Onde
não pôde descer.
Lá
no sertão da Bahia,
Não
lembro a localidade,
Morava
um tal Zé Grandão
Pabulador
de verdade,
Dizia
que medo é tolice
Ou
pura leviandade.
Nem
medo, nem Deus existe!
—
Dessa forma ele falava —
Pois
se existisse Deus
Para
mim se apresentava,
E
medo se existisse
Alguma
vez me tocava.
Por
muito tempo passou
Vivendo
de pabulagem,
Quando
um dia decidiu
Fazer
longínqua viagem,
Pra
ver se Deus existia
E se
medo era vantagem.
02
Matou
um boi já de era,
Pôs
a carne pra secar,
Perto
de duzentos quilos
Para
um burro carregar,
Outro
burro com a farinha
E o
que fosse precisar.
Montou
num burro possante
Levou
arma e munição,
Um
punhal de duas quinas,
Cartucheira
e cinturão,
Um
bom rifle e revólver,
Podia
haver precisão.
Seguiu
pela estrada a fora
Para
o povo perguntando
Se
alguém conhecia o medo
Alguns
vinham confirmando,
Ele
ouvia, mas ia em frente,
Daquela
gente zombando.
No
fim do primeiro dia
Chegou
na última morada,
Pediu-lhe
o dono da casa
Que
ali fizesse pousada,
Porque
era perigoso
Àquela
hora na estrada.
03
É
travessia perigosa,
O
mato é muito fechado,
Viajar
durante a noite
Pra
chegar do outro lado;
Quem
foi nunca retornou,
Teve
um triste resultado!
Ele
não quis nem saber
Fez
logo uma cara dura,
Dizendo:
medo e perigo
Eu
ando mesmo à procura,
Acho
que chegou a hora
Pra
viver minha aventura.
O homem
só fez dizer:
Sendo
assim então que vá,
Não
é mais problema meu
O
que acontecer por lá,
Querendo
fique à vontade,
Mas
não lembre mais de cá.
Tangendo
os seus animais
Viajou
assoviando,
O
sol já ia se escondendo,
A
noite estava baixando,
A
mata muito fechada
Ele
alegre atravessando.
04
Uma
média de dez léguas
Era
aquela travessia,
Quem
andasse a noite inteira
Talvez
que conseguiria,
Fazer
aquele percurso
Chegando
ao raiar do dia.
Zé
Grandão andou bastante
Quando
o cansaço bateu,
A noite
bastante escura,
Bom
espaço apareceu,
Dava
pra seus animais
Ali
as cargas desceu.
Tirando
sela e cangalhas
Peou
os seus animais,
Pegou
lenha fez fogueira
Tudo
ligeiro demais,
Botou
carne para assar
Que
a fome era voraz.
Quando
o fogo virou brasas
Começou
a carne assar,
Pingando
muita gordura
Ele
para aproveitar,
Botou
o sal na farinha,
Começando
a mastigar.
05
Terminou
de assar a carne
Quando
começou comer,
Ouviu
de dentro do mato
Alguma
coisa mexer,
Então
viu uma mulher
Muito
grande aparecer.
A
mulher era bem alta,
Uns
quatro metros de altura,
Do
ombro dela ao quadril
Media
a mesma largura,
Parecendo
um botijão
Sem
ter no meio a cintura.
Zé
Grandão deu boa noite
Já
querendo puxar prosa,
Ela
nem se quer olhou,
Não
demonstrou ser dengosa,
Ele
depressa gritou:
A
senhora é orgulhosa?
Ela
não quis lhe dar bolas
Voltou
ele a insistir,
Convidou
para comer
Ela
fez gesto de rir,
O Zé
quase se assombrou
Com
o que viu a seguir.
06
A
boca dela era enorme
Como
não havia igual,
Tinha
apenas quatro dentes
Cada
um era um punhal,
Largo
grosso e afiado
Bem
na forma natural.
— Vamos comer — disse o Zé,
Nem
terminou de falar,
Notou
pela sombra dela
Que
ela ia se agachar,
Ele
afastou-se ligeiro
Temendo
se machucar.
Ela pegando
a bacia
Cheinha
de carne assada,
Despejou
dentro da boca
Engoliu
sem falar nada,
Parecendo
ter botado
Menos
duma colherada.
Da
mesma forma a farinha
Que
tinha em outra bacia,
Engoliu
vasilha e tudo
Enquanto
pra Zé sorria,
No
momento ele sentiu
No lombo
uma coisa fria.
07
Zé
disse: dona eu preciso
Ir
cuidar dos animais!
Mas
você me espere aqui
Pra
gente conversar mais,
Se
você não me esperar
De
você eu vou atrás!
Ele
sentiu muito medo,
Mas
tentou se controlar,
Foi
ligeiro até os burros
Doidinho
pra se mandar,
Montou
sem sela e cabresto,
Começando
a galopar.
Quando
estava bem distante
Foi
que veio ao pensamento,
Que
deixara tudo pra trás,
Sela,
carne e armamento,
Devido
a pressa que tinha
Pelo
medo violento.
Como
demorou voltar
A
fera desconfiou,
Disse
ela: fui enganada!
Atrás
do Zé se mandou,
Encontrando
os animais
Todos
eles devorou.
08
Depressa
saiu correndo
Do
Zé seguindo a pegada,
Ele
de longe escutava
Da
fera a grande zoada,
Ela
gritava: me espera!
Rasgando
a mata fechada.
Em
alta velocidade
O Zé
corria assombrado,
Devido
a longa corrida
O
animal já cansado,
Caiu
por terra ofegante
No
chão ficando estirado.
Zé
conhecendo que o burro
Não
podia prosseguir,
Levantou
saiu correndo,
Não
poderia desistir,
E a
fera atrás gritando:
Espera,
que eu quero ir!
Quanto
mais ouvia o grito
Mais
aumentava a carreira,
Atravessou
um riacho
Subiu
numa ribanceira.
Viu
uma árvore bem alta
Na
subida da ladeira.
09
Ele
já muito cansado
De
correr estava farto,
Abraçou
a árvore dizendo:
Dessa
aqui não me aparto,
Subiu
com velocidade
Que
parecia um lagarto.
Escanchou-se
em uma galha
A
quinze metros de altura,
De
lá avistando o burro
Por
cima da mata escura,
Quando
a fera apareceu
Baixou
nele a dentadura.
Com dentes
bem afiados
O
burro ao meio cortou,
Dividiu
em quatro partes
Uma
a uma a devorou,
Jogando
goela abaixo,
Do
burro nada restou.
Ele
observando tudo,
Começou
logo a tremer,
De
Deus então se lembrou,
Sentiu
medo de morrer,
Porque
escutou a fera
Gritando:
pode descer!
10
A
fera chegou embaixo
Da
árvore, pôs-se a gritar:
Desça
daí camarada
Que
eu vou lhe devorar!
Porém
a árvore era alta,
Era
difícil alcançar.
A
fera mordia o pau
Com
a forte dentadura,
Os
dentes iguais a punhais
Cortando
a madeira dura,
Tirando
lascas do pau,
Afinando
sua grossura.
Disse
a fera: vou dormir
Aqui
um minuto só,
Porém
não pense em fugir
Porque
eu não tenho dó,
Aviso
que se descer
Não
largo o seu mocotó.
Com
meia hora de sono
A grande fera acordou,
Limpou
os dentes na mão
Na
madeira abocanhou,
Chegando
até a metade
Que
o Zé se arrepiou.
11
Disse
a fera novamente:
Vou
cochilar um pouquinho,
Para
sonhar com vovó
Que
vem me fazer carinho!
Mas
não dormiu porque Zé
Fez
enorme burburinho.
Mordeu
o pau novamente
Que
ele ficou balançando,
Nessa
hora ouviram gritos,
Vinha
o dia clareando,
Um
grupo de comboieiros
Vinha
se aproximando.
Zé
gritou: valha-me Deus!
Valhei-me
Nossa Senhora!
Os
comboieiros ouviram
Correram
na mesma hora
Fazendo
grande alarido,
Nisso
a fera foi embora.
Eles
subiram umas cordas
Pra
poder descer o Zé,
Ele
tremendo de medo
Mas
sabendo Deus quem é,
Que
ninguém deve zombar
Nem
do medo nem da fé. FIM
12
A LÓGICA DA FREIRA
Freira levanta o hábito – para fazer o lógico
Homem com as calças abaixadas – para fazer o lógico
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