Continuação
O
Boi Mandingueiro
E o
Cavalo Misterioso
Luis da Costa Pinheiro
O
LEITOR deve lembrar-se
Do
romance antepassado,
Do
grande Boi Mandingueiro
De Genésio
o afamado,
Atento
ouvindo o Boiadeiro
Falar
sobre o Mandingueiro
Ficando
impressionado.
--
Verem ele mas não pegam
Saem
de lá desenganados,
Cavalos
bons de fiança
Morrem
no campo cansados,
Tem
abalado vaqueiros
Muitos
até feiticeiros,
De
oito ou dez Estados.
O
dono do dito boi
É o
capitão Monteiro,
Gratifica
quem pegar
O
dito Boi Mandingueiro,
Quem
fizer o seu intento
Da a
filha em casamento,
E
mais 10 contos em dinheiro.
01
Quando
o homem assim falou
Ali
no Boi Mandingueiro,
O
cavalo deu um salto
Com
o corpo tão ligeiro,
Parecendo
ser um veado
Deixando
quase assombrado
O
recente fazendeiro.
Cavando
o chão com as patas
Rinchando
desesperado,
Disse
Genésio: ele ouviu
O
senhor falar em gado,
Disse
o boiadeiro: oi!
Só
por ouvir falar em boi,
Ficou
assim tão vexado.
--
Te ajeita Misterioso
Assim
Genésio ralhou,
Neste
momento o cavalo
Com
toda calma ficou,
Houve
entre ambos um segredo
Que
o homem teve medo,
Quando
isso observou.
Genésio
fita o cavalo
Fingindo
querer falar,
O
cavalo da mesma forma
Fingindo
querer rinchar,
O
recente boiadeiro
Olhando
pra o vaqueiro,
Quis
até desconfiar.
02
Disse
Genésio sorrindo:
-- É
porque lá não tem homem,
Correm
em cavalos cansados
Que
vivem, porém não comem,
Não
são como este meu
Que
no dia que nasceu
Derrubou
um lubisomem.
Meu
cavalo se sustenta
Com
ferro velho fundido,
Come
enxofre em vez de milho
Bebe
chumbo derretido,
Quando
se dana então
Dez
latas de alcatrão
Com
sede já tem bebido.
Em
que paragem habita
Esse
grande fazendeiro?
--
No sertão do Siridó
Respondeu
o boiadeiro,
Na
fazenda Boa Vista
Nesse
canto se avista,
A
morada do Monteiro.
Sorrindo
disse Genésio:
--
Eu vou experimentar,
Se
este boi tem carreira
Que
dê para eu suar,
Se
este boi é o cão
Se
ele anda no chão,
Ou
se voa pelo ar.
03
No
outro dia cedinho
O
acavalo ele selou,
E
vestiu o gibão velho
Sem
demora ele marchou,
O
vaqueiro rijo e forte
No
Rio Grande do Norte
Sem
demora ali chegou.
Vestiu
o gibão de couro
Feito
de couro de vaca,
Tendo
mais de cem remendos
Cozido
a ponta de faca,
De
longe se via a linha
E em
cada bolso tinha,
Um
cento de jararaca.
E os
estribos da sela
Eram
quengos amarrados,
Com
lóros de couro cru
Velhos
e já remendados,
E
amarrados na borda
Com
um pedaço de corda
Que
matou três enforcados.
No
pescoço do cavalo
Apareceu
uma medalha,
Com
um letreiro visível
Quem
ler bem não se atrapalha,
Era
um ditado animoso
“CAVALO
MISTERIOSO”
O
vencedor de batalha.
04
O
cavalo emagreceu
De
contar osso por osso,
Ficou
um esqueleto horrível
De
causar até sobroço,
Parecendo
um saruê
Onde
se punha em pé,
De
suor ficava o poço.
No
peito do cavalo tinha
Aquele
sino Salomão,
Esse
já nasceu com ele
Que
diz na mesma oração,
Sinal
muito perigoso
Cavalo
misterioso,
O
vencedor de questão.
E na
anca do cavalo
Um
letreiro apareceu,
Muito
bem caligrafado
Foi
um gênio que escreveu:
Sou
um gênio da floresta
Venho
divertir a festa,
E
quem pega o boi sou eu.
Um
letreiro bem visível
Na
testa dele se lia:
Eu
sou o rei da floresta
O
terror da penedia,
Pra
correr tenho tabelas
E
reforçadas canelas,
E só
corro em demasia.
05
E na
pá estava escrito
Eu
sou feroz na caatinga,
Boi
de fama para mim
Muito
tempo não rezinga,
Porque
sou muito ligeiro
Boi
corredor feiticeiro,
Para
mim não tem mandinga.
Afinal
chegou Genésio
Na
casa do fazendeiro,
Saudou
com todo respeito
O
senhor Francisco Monteiro,
Então
o Misterioso
Como
era caviloso,
Quis
se deitar no terreiro.
Perguntou
o fazendeiro:
Moço
o senhor é malvado?
Montar-se
neste cadáver
Magro,
velho e assim cansado,
Disse
Genésio a sorrir
Ele
gosta é de fingir,
É
magro assim de danado.
--
Conte a história direito
O
senhor e um malvado,
Para
criticar do pobre
Escreveu
esse ditado,
Quer
quinze mil réis por ele?
Pode
desmontar-se dele
Disse
Genésio: Obrigado!
06
--
Onde mora o senhor?
Parece
ser cearense,
Disse
ele: Não senhor
Eu
sou um piauiense,
Venho
tratar dum negócio
Porque
do mesmo sou sócio,
Pois
também a mim pertence.
--Eu
soube que o senhor tem
Um
boi terror de vaqueiro,
Eu
quero experimentar
Se
esse boi é ligeiro,
Houve
forte gargalhada
Toda
aquela vaqueirada,
Sorrindo
ali no terreiro.
Disse
o capitão Monteiro:
É um
boi estuporado,
Vaqueiros
fortes e bravos
Não
sabem dar o recado,
Correr
atrás é loucura
É
boi somente em figura,
Mas
é o cão apropriado.
--Ganha
dez contos de réis
O
vaqueiro que o pegar,
E
dou mais a minha filha
Para
com ela casar,
Terá
mais a proteção
Dinheiro
a disposição,
Para
o que precisar.
07
Aí o
Misterioso
Cavou
para se deitar,
Deitou-se
com ele em cima
Sem
poder se levantar,
Todo
povo em alvoroço
A
medalha do pescoço,
Quiseram
até arrancar.
Disse
um vaqueiro gaiato
Acenda
a vela patrão,
O
cavalo quer morrer
Bota
no pé ou na mão?
Aí o
povo zangou-se
Tudo
desta vez danou-se,
Para
fazer mangação.
Disse
Genésio sorrindo:
Deixe
morrer que é meu,
Ele
está fraquinho assim
Porque
hoje não comeu,
Não
foi porque viajou
Com
volta ainda não dou,
Por
quatro dúzias do seu.
Tornou
a dizer sorrindo:
O
vaqueiro Punaré,
O
cavalo quer morrer
Acenda
a vela seu Zé,
Se o
senhor não traz a vela
Encha
de brasa a panela,
Bote
na mão ou no pé.
08
Genésio
então respondeu:
Vossa
mercê não estranhe,
Quem
quiser perder que perda
Quem
quiser ganhar que ganhe,
Não
sou vaqueiro esparrela
É
melhor que a panela,
Vá
botar na sua mãe.
Nestas
frases foi chegando
A
formosa Leonor,
Quando
Genésio viu ela
Ficou
pasmado de amor,
Que
hora feliz ditosa
Também
ficou ansiosa,
Sofrendo
da mesma dor.
Sem
demora o fazendeiro
Chamou-o
para jantar,
Galinha
gorda e peru
Comeu
até se fartar,
Com
a moça de um lado
Pelo
o amor encantado,
Nas
chamas do verbo amar.
Diz
o capitão Monteiro
A um
negro seu criado,
Vá
dar água ao cavalo
E
bote lá no cercado,
Diz
Genésio: Não senhor
Agradeço
este favor
Para
não me dar cuidado.
09
O
cavalo Misterioso
Quem
trata dele sou eu,
O
homem que montar nele
Pode
dizer que morreu,
Outro
não pode existir
Besta
não há de parir,
Cavalo
bom como o meu.
Pois
sendo assim vá botá-lo
Dentro
daquele pomar,
Tem
muita palha de milho
Que
ele come a fartar,
Pediu
licença ao patrão
E na
mesma ocasião,
Foi
ao cavalo arrumar.
O
cavalo levantou-se
Tremendo
e cambaleando,
Com
as pernas muito bambas
E as
juntas estalando,
Tombou
querendo cair
Disse
Genésio a sorrir,
Ele
já vai se danando.
--
Ora já vai se danando
Reboou
a multidão,
O
povo na gargalhada
Só
fazendo mangação,
Cansado
batendo o papo
Aquele
não pega um sapo,
Piado
de pé e mão!
10
Vem
agora aquele besta
Montado
em cima dum pato,
Pegar
o Boi Mandingueiro
Mais
ligeiro do que gato,
Bicho
danado em canela
Cavalo
que tem tabela,
Fica
perdido no mato.
--
Aquilo é um maluco:
Diziam
todos sorrindo,
Genésio
presenciou
Foi
logo ali reagindo:
--
Malucos são os senhores
Vaqueiros
empalhadores,
Não
sabem em quem estão bolindo!
Eu
sou o rei dos vaqueiros
Sou
o vaqueiro Cambonge,
Não
sou como os senhores
Que
deixam o bicho ir longe,
Meu
cavalo está cansado
Porém
é certo o ditado,
“O
hábito não faz o monge”.
Leonor
pelo o rapaz
Estava
apaixonada,
Mas
via o cavalo dele
Ficava
desanimada,
O
positivo não nega
Dizendo;
Aquele não pega,
Nem
uma gata peada.
11
Com
o namoro da moça
Tudo
ali dava cavaco;
--
Uma moça tão bonita
Namorar
este macaco,
Diziam
em gargalhada:
-- O
namoro não é nada,
Pegar
o boi é cavaco.
Enfim
no dia seguinte
Ele
disse ao fazendeiro:
O
senhor faça um favor
De
mandar um companheiro,
Para
este boi me mostrar
Que
quero experimentar,
Se
este boi é ligeiro?
Disse
então o fazendeiro:
Vão
mais de cem campear,
Até
eu vou com vocês
Depois
que nós almoçar,
Disse
Genésio num riso:
--
Daqui a pouco eu preciso,
O
meu cavalo selar.
Então
disse ao caboclo
Vá
abrir logo a porteira,
Esse
passará correndo
Pois
tem a perna ligeira,
É
preciso advertir
Quando
o cavalo sair,
Não
vá tirar brincadeira.
12
Quando
o rapaz chegou lá
Ele
estava estirado,
Mais
de duzentos urubus
Em
cima dele montado,
O
rapaz observou
E de
perto examinou,
Já
com um olho furado.
Chegando
disse a Genésio
Quase
sem poder falar,
Disse
Genésio: É dormindo
Não
quis ainda acordar,
Quando
ele está assim
A
coisa não está ruim,
Não
é bom incomodar.
Talvez
que ele agora
Ande
pelo estrangeiro,
Tratando
de algum negócio
Que
é muito interesseiro,
A
maré dele não vasa
Está
preparando a asa,
Pra
correr no tabuleiro.
Ele
é o misterioso
Nada
lhe causa embaraço,
Tem
as canelas de ferro
A
resistência de aço,
Brinca
nas asas do vento
Viaja
no pensamento
Passeia
pelo espaço.
13
Conhece
o mundo inteiro
Já
andou na Alemanha,
De
lá já foi derribar
Um
barbatão na Espanha,
É o
terror do vaqueiro
Boi
do mocotó ligeiro
Pra
ele é uma aranha.
Disse
que ele morreu
Não
é verdade este fato,
Qualquer
que bolir com ele
Verá
pular como um gato,
Precisa
eu ir acordá-lo
Para
com tempo selá-lo
Para
corrermos no mato.
O
rapaz disse: Está morto
Os
urubus já puxando,
Disse
Genésio: É impossível
Vejo
escaramuçando,
Leonor
dizendo oi!
Se
ele não pegar o boi,
Vai
terminar não casando.
O
fazendeiro foi ver
Se
era o cavalo do moço,
Avistou
ele de formas
Que
só estava o arcabouço,
Com
mais de cem urubus
Comendo
os pedaços crus,
Que
no chão estava grosso.
14
Chegou
e disse sorrindo:
O seu
cavalo está morto,
Não
senhor, disse Genésio:
Está
tomando conforto,
Ele
agora foi ao mar
E
depois quando voltar,
Vem
ancorar neste porto.
Enfim
chegaram os vaqueiros
Em
bons cavalos montados,
Disse
Genésio: Esses ganchos
Eu
deixo todos logrados,
Nunca
viram boi correr
Hoje
todos tem que ver
Três
demônios encangados.
Botou
o dedo na boca
Deu
um assovio espantoso,
Depois
um grande aboio
Chamando
o Misterioso,
O
cavalo deu um rincho
Depois
soltou um guincho,
Que
este foi pavoroso.
E
veio se desembestando
Lá
da banda do aprisco,
Dando
salto com três metros
Ligeiro
como um corisco,
Com
medo disseram oi!
Genésio
disse: Esse boi,
Dar
muito bom um petisco.
15
Estava
gordo em formas
De
deixar tudo assombrado,
O
corpo descomunal
Tamanho
demasiado,
De
todos admirá-lo
Não
era mais o cavalo,
Que
ele chegou montado.
Perguntou
o fazendeiro:
O
seu cavalo é o cão?
Não
senhor disse Genésio:
Mas
faz a imitação,
Foi
nascido para mim
Não
monto cavalo ruim.
Tenho
esta opinião.
O
rapaz foi ver se via
A
carniça no roçado,
Não
encontrou nem sinal
Que
tivesse se espojado,
Voltou
então na carreira
Ao
passar pela porteira,
Já
foi quase assombrado.
Enfim
todos os vaqueiros
Fizeram
reunião,
Tudo
estava comovido
Em
completa comoção,
Os
cavalos espantados
De
cabelos arrepiados,
Que
chamou tudo atenção.
16
Disseram
todos vaqueiros
Este
cavalo é o cão,
Deixou
os nossos assombrados
Causando
admiração,
Disse
Genésio: Ele é rei
É um
direito da lei,
Honrarem
seu pavilhão.
Quando
chegaram no mato
Estava
o Mandingueiro,
Perguntou
o boi é aquele?
--
É... disse o fazendeiro,
Disse
Genésio é bichão
E
parece com o cão,
E
este boi é ligeiro.
E
gritou ao Mandingueiro
Eu
sou o rei da floresta!
Tome
cuidado na vida
Que
está comigo de testa,
Prepare
suas canelas
Bote
oito asas nelas,
Para
dançarmos na festa.
O
boi soltou um mugido
Nos
quatro pés se ergueu,
E
logo em cima do boi
Um
letreiro apareceu,
Dizendo:
Tu hás de ver
Nunca
viste boi correr,
Vás
conhecer quem sou eu.
17
Noutro
letreiro dizia:
Para
correr eu me gabo,
Sou
filho de uma fada
Que
é o mesmo diabo,
É
melhor você voltar
Vens
o cavalo cansar,
E
não me pega no rabo.
Aí
fechou na carreira
Com
asas de pirilampo,
Com
ligeireza de raio
Quando
desaba no campo,
Disse
Genésio: Espere!
Sua
carreira modere,
Pra
eu curar seu sarampo.
Desembestou
a correr
Não
era mais choteando,
O
Misterioso em cima
Danadamente
pisando,
Só
se via o fumaceiro
No
meio do tabuleiro,
Como
fogo fumaçando.
O
boi em toda carreira
Paus
com as pontas arrancava,
Em ganchos
de aroeiras
Como
vampiro passava,
O
cavalo atrás passando
A
tropelada imitando,
O
trovão que reboava.
18
Então
o boi Mandingueiro
Terrivelmente
corria,
O
cavalo no mocotó
Que
nem um palmo cedia,
Num
desfiladeiro vai
Como
um raio que cai,
Em
noite de ventania.
Era
uma zoada enorme
De
muito longe se ouvia,
Grande
nuvem de poeira
Que
todo monte cobria,
Era
Martim, Paulo e Sancho
Folha
seca e garrancho,
Subindo
na ventania.
Disse
Genésio sorrindo:
Agora
vamos ao centro,
Se
caíres num buraco
Demônio,
contigo entro,
Porque
também sou moderno
Se
caíres no inferno,
Eu
caio contigo dentro.
Pulava
o Boi quinze metros
Em
cada pulo que dava,
O
Cavalo Misterioso
Seu
mocotó não largava,
Mais
veloz que passarinho
Fumaça
pelo o focinho,
O
Mandingueiro soltava.
19
De
vez em quando Genésio
Ia à
cauda caqueando,
Mas
o boi como uma bala
Ia
se escorregando,
Era
mesmo que o diabo
Somente
a ponta do rabo,
Era
o que ele ia alcançando.
Com
três horas de viagem
O
Mandingueiro afracou,
O
cavalo Misterioso
Na
anca dele montou,
Genésio
passou lhe a mão
Foi
tão grande o arrastão,
Que
cinco vezes rolou.
Conhecestes
boi danado
Quem
é o misterioso!
Pensavas
que pra correr
Só tu
eras vantajoso!
Agora
fique sabendo
Em
tudo reconhecendo
Que
também sou valoroso.
Pensavas
que pra correr
Só
tu nasceste profundo!
Agora
fiques sabendo
Que
encontrastes segundo,
Ontem
terror do vaqueiro
E
hoje no tabuleiro,
Promovido
a vagabundo.
20
Quando
o boi se levantou
Fechou
de novo à carreira,
Parece
que criou asas
Na
mais fechada madeira,
Genésio
ia achando graça
Disse:
A tua desgraça,
Foi
só cair da primeira.
Correndo
horrivelmente
Em
seguida para traz,
Genésio
disse sorrindo:
--
Abra o olho satanás,
Eu
torno a te derribar
Para
poder te mostrar,
Como
é que um vaqueiro faz.
Correndo
danadamente
Na
mais fechada caatinga,
Ainda
disse Genésio:
É
uma forte a rezinga,
Ninguém
virá te valer
Só
deixarei de correr,
Quando
tirar-te a mandinga.
O
cavalo outra vez
Em
cima dele bateu,
Genésio
deu um arrasto
Que
ele se estendeu,
Fogo
da venta saindo
Disse
Genésio sorrindo
Conheceste
quem sou eu!
21
Escornou
o Mandingueiro
Da
queda bem machucado,
De
suor o corpo dele
Estava
todo molhado,
Porém
o Misterioso
Sendo
o mais perigoso,
Inda
não estava suado.
Quando
os vaqueiros chegaram
Já
ele estava pegado,
No
domínio de Genésio
Muito
bem subjugado,
Então
disse o fazendeiro
Olhando
para o vaqueiro,
Conheceste
boi danado!
Murmurou
então Genésio:
Nunca
tinha encontrado,
Um
boi da espécie deste
Só
sendo estuporado,
Deu-me
trabalho a pegá-lo
Porém
encontrou cavalo,
Que
sabe dar o recado.
Tudo
ali muito assustado
Olhavam
para o vaqueiro,
Dizendo:
Este é um danado
Pegar
o Boi Mandingueiro,
Dez
contos de réis ganhar
Ainda
mais se casar,
Com
a filha do fazendeiro!
22
Só o
capitão Monteiro
Que
muito alegre ficou,
Abraçou-se
com Genésio
A
mão dele apertou,
Genésio
cheio de alegria
No
pensamento dizia:
Minha
fortuna chegou.
Disse
o capitão: Matem o boi
Para
esse povo comer,
Genésio
disse: Eu compro
Se
acaso queira vender,
Digo
com sinceridade
O
boi dessa qualidade,
Faz
pena se ver morrer.
Enfim
o capitão Monteiro
Docilmente
respondeu:
Você
há de ser meu genro
Tudo
que possuo é seu,
Teve
vaqueiro que ouvindo
Ficou
irado rangindo,
Que
de inveja morreu.
Levaram
o boi na frente
Pra
casa do fazendeiro,
Genésio
deu um aboio
Ali
perto do terreiro,
O
aboio foi plangente
Que
não ficou um vivente,
Que
não amasse o vaqueiro.
23
O
capitão disse a ele:
Moço
torne a aboiar,
Mais
de quinhentos vaqueiros
Vieram
pra escutar,
Depois
de ter aboiado
Começou
chegar o gado,
Pondo-se
tudo a chorar.
Com
o aboio de Genésio
Chorou
até Leonor,
Caindo
sobre os pés dele
Abrasada
só de amor,
Desapeou-se
da sela
E
pegou no braço dela,
Consolando
a sua flor.
Então
capitão Monteiro
Mandou
botar o jantar,
Pra
Genésio e a filha
Em
lugar particular,
E
ele foi o copeiro
Para
a filha e o vaqueiro,
Foi
um ótimo auxiliar.
Enfim
perguntou o moço:
Você
me ama ou não?
Disse
ela: A ti consagro
A
mais ardente paixão,
Que
se pudesse botava
As
flores e te enfeitava,
Dentro
do meu coração.
24
Toca
a coisa animar-se
Na
casa do fazendeiro,
Ninguém
contava as mesadas
Que
tinha pelo terreiro,
A
música inteira tocava
Tudo
na festa gritava,
Dando
viva ao vaqueiro.
Leonor
disse: Genésio
Vá
esta roupa mudar,
Diz
ele: Só tenho essa
Só
se avessa eu virar,
Se
tem outra que me dê
Eu
acho bom que vá ver,
Pra
esta então eu tirar.
--
Tem a roupa de papai
Se
quer vestir, eu vou ver,
Disse
ele: Não senhora
Vou
mandar essa bater,
Engomar
este gibão
Com
enxofre e alcatrão,
Pra
me casar com você.
Disse
lhe a moça sorrindo:
Casar
com esta broaca,
Que
quando você se move
Ela
exala uma inhaca,
Naturalmente
ela olhou
Num
dos bolsos avistou,
Um
cento de jararaca.
25
--
São Bento... Olhe uma cobra
No
bolso do seu gibão!
Gritou
ela assustada
Causando
admiração,
Disse
ele: São amigas
Moram
aqui sem fadigas,
Patrícias
do meu sertão.
O
pau para ser bonito
Deve
ser bem enfolhado,
O
homem pra ser vaqueiro
Deve
andar bem preparado,
São
enfeites do gibão
Um
símbolo da profissão,
Da
arte de pegar gado.
Meteu
a mão no gibão
Tirou
as cobras e mostrou,
Quatro
jararacas azuis
No
mesmo bolso guardou,
A
moça ficou com medo
Vendo
aquele brinquedo,
Perto
dele não chegou.
Afinal
o fazendeiro
O
padre mandou chamar,
Para
casar Leonor
Já
tinha feito o altar,
Casou
Genésio tão bem
Porque
casou-se com quem,
Nunca
pensou de casar.
26
Casou-se
com Leonor
Mas
vestido no gibão,
De
vez em quando uma cobra
Saía
pelo o rasgão,
Pois
tinha muito de sobra
Ele
era um vaqueiro cobra,
Mostrando
essa imitação.
Havia
um outro vaqueiro
Que
amava Leonor,
Consagrava
uma amizade
Com
o mais profundo amor,
Quando
viu ela casada
Ficou
de bola virada,
Sofrendo
profunda dor.
Teve
na festa chorando
Igual
um alienado,
Cortou
um cipó no mato
E
foi morrer enforcado,
O
velho Zé Nicolau
Encontrou
ele num pau,
Já
morto dependurado.
Então
contou a história
Do
vaqueiro a Leonor,
Diz ela:
Fez uma asneira
Morrer
por causa de amor,
Por
meu respeito não foi
Ele
não pegou o boi
Perdeu
de todo o valor.
27
Genésio
levou dez contos
Por
ter ganhado a questão,
Na
santa paz conjugal
Fizeram
a santa união,
Era
ele o melhor vaqueiro
Terminou
sendo o herdeiro,
Da
riqueza do patrão.
Dentro
dum grande cercado
Botaram
o Mandingueiro,
Com
ele o Misterioso
Com
o ferro do Monteiro,
Do
cercado eles fugiram
Os
donos nunca mais viram,
Jamais
tiveram roteiro.
Certo
dia o fazendeiro
Andava
pelo cercado,
Era
meio dia em ponto
Ele
bastante cansado,
Debaixo
de um arbusto
Tranquilamente
sem susto,
Foi
descansar um bocado.
Quando
ele estava deitado
Viu
chegar quatro urubus,
Mais
preto do que carvão
Tendo
reflexo de luz,
O
fazendeiro pensava
Sendo
preciso jurava,
Que
eram quatro jacus.
28
Pousaram
no mesmo pau
Onde
estava o fazendeiro,
Então
perguntou um deles
Ao
que chagara primeiro,
De
onde vens camarada?
Respondeu
em gargalhada,
Eu
venho do estrangeiro.
-- O
que fazias por lá
Respondeu
o camarada:
Do
grande Boi Mandingueiro
Fui assistir
a chegada,
Na
sua recepção
Foi
grande a animação,
A
festa foi arrojada.
--
Dais notícia do cavalo?
Disse
o terceiro: Pois não!
Está
sendo castigado
Por
ter pego o próprio irmão,
Ele
lá dar grande ronco
Preso
em um grosso tronco,
Levando
muito facão.
E a
vaca Misteriosa
O
que é que está fazendo?
--
Tomando banho num poço
Quente
com água fervendo,
Semelhante
a um tacho
De
cabeça para baixo,
Vive
subindo e descendo.
29
Porque
ela está sofrendo?
Interrogou
o terceiro,
Porque
viveu sendo vaca
Na
fazenda do Monteiro,
E
foi covarde em morrer
E
não pôde defender,
O
filho, daquele vaqueiro.
Enfim
o último disse:
Não
podia defender,
Porque
o pai de Genésio
Soube
a coisa fazer,
Pegava
qualquer de nós
Por
mais que fosse veloz,
Se
fosse também correr.
Aí
deram uma risada
Que
tremeu até o chão,
Logo
desapareceram
Nesta
mesma ocasião,
Disse
o fazendeiro: Credo!
Se
arrepiando do medo,
Dizendo
aquilo é o cão.
Chegou
em casa assombrado
A
mesma história contou,
Genésio
aí sorriu muito
Depois
então exclamou,
A
ciência de meu pai
Ainda
surgindo vai,
Nunca
mais se acabou.
30
Nunca
mais vi meu cavalo
Em
que eu pegava gado,
Animal
de pernas fortes
Que
nunca ficou cansado,
Meu
pai era experiente
Sabia
perfeitamente,
Deu-me
este preparado.
Credo!
Disse o fazendeiro
Seu
pai era um danado,
Um
feiticeiro de força
Pelo
o demônio ajudado,
Ele
disse: Não senhor
Meu
pai era um professor,
Na
arte de pegar gado.
O
finado meu avô
Era
Chico Punaré,
No
dia que se danava
Que
bulia na coité,
Tinha
seu músculo de aço
Lubisomem
era no laço,
Mãe
d`água no gereré.
O
velho meu bisavô
Era
Félix Embuá,
Era
um velho preparado
Carregava
um patuá,
Levava
tudo de arrojo
Pegava
alma de fojo,
Fantasma
de landuá.
31
O
pai do meu trisavô
Era
um velho espanhol,
De
longe os olhos dele
Pareciam
um farol,
Mesmo
no pé da parede
Pegava
satã com rede,
Mula
de padre em anzol.
Esses
foram aprendizes
Do
finado Andorinha,
Para
pegar qualquer bicho
Soprava
numa gaitinha,
Esse
era um bom rapaz
Chamava-se
Ferrabraz,
Com
toda cólera que tinha.
Findei
aqui o meu drama
Todo
fato que se deu,
De
forma que o cavalo
Atrás
desse boi correu,
Se
isso não foi exato
Quem
quiser que pague o pato,
Não
culpe a quem escreveu. FIM
32
ENCONTRO ENTRE VALENTÕES
José Edimar
No
mundo tem um dilema
Que
ninguém pode negar,
O mal
existe e acontece
Sem a
gente procurar,
Muita
gente boa encontra
E não
consegue escapar.
Lembro
de Santa Quitéria
No Estado
do Ceará,
Terra
de homens valentes
Com
força no patuá,
Quando
nascia algum mole
Já
descambava de lá.
Antônio
Almeida Soares
Teve o
nascimento ali,
Mas
ainda muito novo
Mudou-se
pra Buriti
Dos
Lopes, bela cidade
No
norte do Piauí.
01
Lá em
Buriti dos Lopes
Ficou
sendo morador,
Considerado
homem rico
Honesto
e trabalhador,
Tendo esposa
e um filhinho
A quem
dedicava amor.
.
Por ser
homem muito rico
Ajudava
a muita gente,
Cidadão
muito educado
E
bastante sorridente
Apesar
da gentileza
Era
disposto e valente.
Media
um metro e noventa
Pois
tinha bastante altura,
Pesava
em média, cem quilos
Por ser
de grande estatura,
Tendo
nos braços e pernas
Força
na musculatura.
Era
homem corajoso
Mas era
um senhor do bem,
Dum
revólver trinta e oito
Não se apartava
também,
Com
cinto cheio de balas
Mas não
abusava a ninguém.
02
Participava
das festas
Onde
dançava bastante,
Gentil
e respeitador
Um
porte muito elegante
Porém
não temia a nada
Preparado
a todo instante.
O
Sargento Agenor
Cuidava
da guarnição
Comandando
três soldados
Patrulhando
a região
Mas o
delegado era
Tenente
Sebastião.
Muita
inveja de Antônio
Esse
Sargento sentia,
Vendo
ele com revólver
A
qualquer hora do dia,
Tinha
medo de abordá-lo
Temendo
sua valentia.
Mas
desejava tomar
Aquela
arma do rapaz,
Porém temendo
a bravura
Que
Antônio era voraz,
Vivia
sempre aguardando
Sem
querer deixa-lo em paz.
03
Antônio
era convidado
Das
festas da vizinhança,
Amigo
de todo mundo
E homem
de confiança,
Uma
pessoa importante
Também
muito bom de dança.
Antônio
foi uma festa
Na casa
de um amigo,
Por ser
um dos convidados
Tinha
com certeza abrigo,
Mas andava
sempre armado
Mesmo
sem haver perigo
Foi uma
festa importante
Que
aconteceu na cidade,
Antônio
estava feliz
Com
toda tranquilidade,
Porque
com o promovente
Tinha
uma grande amizade.
O
Sargento Agenor
Também
foi pra brincadeira,
E viu
Antônio dançando
Com
revolver e cartucheira,
Sem
coragem de enfrenta-lo
Cometeu
grande asneira.
04
Foi
procurar o Tenente
E foi
logo lhe falando,
Que
Antônio estava na festa
Com
todo mundo abusando,
Armado
com um revólver
Muitas
balas carregando.
Dizendo:
-- Não lhe prendi
Porque
ele tem valor,
Não
está acima da lei
Mas vim
falar com o Senhor,
Pra
fazê-lo eu pretendo
Ter
ordem superior.
O
Tenente respondeu:
-- Sargento
tome cuidado,
Antônio
é rico e valente
Dinheiro
tem um bocado,
Tente
acalmar o rapaz
Deixando
ele desarmado.
-- Não
vá me fazer besteira
Pois Antônio
é boa gente,
Amigo
de todo mundo
Tem
grana suficiente,
Tem que
respeitar o homem
Porque
é muito valente.
05
O
sargento novamente
Foi onde
Antônio dançava
No meio
da multidão
Nele o
sargento encostava
Sem
dizer uma palavra
Tinha medo
e retornava.
Mas
depois de algum tempo
O
sargento resolveu,
Desarmar
Antônio a força
Era o
pensamento seu,
Partiu
pra ele apressado
Veja o
que aconteceu.
Chegou e
agarrou na cinta
Que o
cinturão partiu,
A
cartucheira de balas
Com o
revolver caiu,
Saiu das
mãos do sargento
Sobre o
piso escapuliu.
Antônio
muito ligeiro
Seu
revolver agarrou,
Aberturando
o sargento
Que do
chão o levantou
Como
estava zangado
Por
esta forma falou:
06
-- Se
desejava o revólver
Bastava
pedir a mim,
Que eu
lhe entregaria
Mas se
preferiu assim,
Vou lhe
meter uma bala
Aqui
mesmo lhe dou fim.
E meteu
a arma nele
Segurando
com a mão,
Com um
só tiro o sargento
Ficou
morto ali no chão,
Antônio
saiu da festa
Pra
resolver a questão.
Foi
procurar o Tenente
Que era
o delegado,
Contou-lhe
o ocorrido
Conforme
havia passado,
O Tenente
respondeu:
-- Ele
saiu avisado.
Chegaram
os três soldados
Que
acompanhavam o sargento,
E
daquela narrativa
Eles
ouviram a contento,
E
confirmaram ao Tenente
Ali
naquele momento.
07
Disse o
Tenente a Antônio:
-- Está
tudo esclarecido,
Foi uma
pena o sargento
Nessa
luta ter morrido,
Você
fez sua defesa
Ele
morreu de atrevido.
Antônio
voltou pra casa
Porém chegou
pensativo,
Pra ele
matar alguém
Era um
ponto negativo,
Se não
fosse seu impulso
O
sargento estava vivo.
A vida
continuou
Antônio
se divertindo,
Fazendo
mais amizade
Porém
vinha pressentindo,
Que
atrás dele havia alguém
O tempo
todo seguindo.
Completando
oito meses
Daquele
acontecimento,
Voltando
um dia pra casa
Não
pensava no momento,
Naquele
triste ocorrido
Nem
tinha pressentimento.
08
Um
daqueles três soldados
Que
andava naquele dia,
Acompanhando
o sargento
Daquilo
não esquecia,
Pensava
em seu coração
Que
então se vingaria.
Convidou
mais três amigos
Esses
três eram novatos,
Que
conheciam a história
Só por
meios de relatos,
Eles se
prontificaram
A
terminar os boatos.
Este
soldado que falo
Com
vinte anos de farda,
Era
Lindomar Frazão
Que
patente sempre tarda,
Para
quem não tem estudo
Permanece
sempre Guarda.
Eles
foram observar
Qual
era a situação,
Olhar
em toda cidade
Prestando
toda atenção,
Para
encontrar Antônio
E tomar
uma posição.
09
Depois
que avistaram Antônio
Foram
pensar num local,
Para
botar-lhe uma tocaia
E não
se saírem mal,
Porque
peitá-lo de frente
Isso
não era legal.
E
pensaram no jardim
Em
frente a sua morada,
E para
não serem vistos
Foram
tomando chegada,
Ficando
lá escondidos
Pra
pegarem de emboscada.
Eram
seis horas da tarde
Já
estava escurecendo,
Antônio
vinha encostando
Como eu
vinha descrevendo,
Quando
o tiroteio comeu
E ele
gritou dizendo:
-- Me
pegaram seus covardes
Porque
foi a traição,
De
frente a frente eu duvido
Terminava
a munição,
Não
ficava um só bandido
Pra
comentar a questão!
10
Foram
mais de doze tiros
Antônio
ficou caído,
Inda
tentou levantar
Mas
mortalmente ferido,
Sem
haver nenhum socorro
Ficou
no chão estendido.
Com a
morte de Antônio
Os
policiais correram,
Chegaram
à delegacia
Por lá
se esconderam,
Ninguém
ouviu mais falar
Talvez
desapareceram.
No
velório de Antônio
Houve
muita comoção,
Muita
gente reunida
Discurso
e falação,
No
enterro muito choro
Abraço
e aperto de mão.
Tenente
Sebastião
Chefe da
delegacia,
Expulsou
os três novatos
Ainda
naquele dia,
Disse a
Lindomar Frazão
Que
também não lhe queria.
11
Ajeitou
sua transferência
Quem
sabe pra outro Estado,
Ninguém
mais ouviu falar
Também daquele
soldado,
Talvez
ele até pensasse
Que não
era mais lembrado.
Antônio
deixou um filho
Com dez
anos de idade,
Por
nome de Maciel
Um jovem
de hostilidade,
Vingar
a morte do pai
Era sua
maior vontade.
Mas
ninguém ali sabia
Em casa
ou na vizinhança,
Quem
seria o responsável
Por ter
feito à matança,
E sua
mãe sempre dizia
Esqueça
dessa vingança.
Para
descobrir quem foi
Era só
no que falava,
Todo
dia a sua mamãe
Daquilo
lhe reclamava
Pra
mudar de opinião
Porém
ele não mudava.
12
Com
nove anos depois
Maciel
era um rapaz,
Não esquecia
o pai dele
A raiva
aumentava mais,
Comprou
logo um caminhão
Decidido
a ir atrás.
Um
revólver trinta e oito
E uma
caixa de balas,
No
porta luvas do carro
Que não
tinha porta malas,
Mantinha
sempre guardado
Acompanhando
as escalas.
O soldado
Lindomar
Tomou
um novo roteiro,
Deixou
Buriti dos Lopes
Levando
pouco dinheiro,
Foi
direto ao Ceará
Pra Cidade
Tabuleiro.
Em
Tabuleiro do Norte
Ficou
por lá esquecido,
Da
Cidade Buriti
Pensou
que estava escondido,
Mas
quando a sorte não quer
Qualquer
esforço é perdido.
13
Transferido
se manteve
Na
polícia novamente,
Alguns
fatos na carreira
Rendeu-lhe
até patente,
Com dez
ou doze anos
Ele já
era Tenente.
Maciel
no caminhão
Começou
a transportar,
Para
todo Piauí
Sem
deixar de procurar,
Sobre a
morte de seu pai
Confiante
em encontrar.
Viajou
no Maranhão
No
Estado do Pará,
Também
em todo Goiás
Depois
voltando de lá
Decidido
percorreu
As
terras do Ceará.
Certa
vez em Tabuleiro
Ele foi
pra abastecer,
O seu
caminhão num posto
Quando
ouviu alguém dizer:
-- Olha
quem está ali
Quem eu
acabo de ver!
14
-- Quem
tu viste pra ficar
Assim
com essa aflição?
O outro
lhe respondeu:
-- É o
Tenente Frazão!
Maciel
se virou logo
Ficou
prestando atenção.
--Quem
é Tenente Frazão
Falar
dele eu nunca ouvi?
-- Foi
aquele que matou
No
Estado do Piauí,
Antônio
Almeida Soares
Na
Cidade Buriti.
Lá em
Buriti do Lopes
Antônio
era Valentão,
Amigo
de todo mundo
Um
homem de condição,
Foi
morto com vários tiros
Tudo
feito à traição.
Maciel
olhando viu
Oito
homens bem sentados,
Pegou
logo o seu revólver
Vendo
eles animados,
Era um
grupo da polícia
Notou
que estavam armados.
15
Encostando
perguntou:
-- Qual
dos senhores aqui,
Matou
Antônio de Almeida
Na
Cidade Buriti?
O
tenente Lindomar
Foi
falando logo ali:
--
Antônio Almeida Soares
Quem
matou ele fui eu!
Quando
ele disse assim
Ligeiro
a bala comeu,
Um tiro
acertou na boca
Só com
aquele morreu.
Maciel
já foi dizendo:
--
Alguém tá querendo mais?
Se não
querem fiquem calmos
Joguem
as armas para traz,
Que
recolho e vou embora
Todo
mundo fica em paz.
Todos
jogaram as armas
Maciel
se encarregou,
De
botar numa sacola
Bem
rápido se retirou,
E em Tabuleiro
do Norte
Ele
nunca mais passou. FIM
16
ALFREDO
E JULHINHA
Severino
Gonçalves de Oliveira
Eis
aqui caros leitores
Outro
caso interessante,
Que
deu-se no Rio Grande
Com
um rapaz viajante,
Dos
dramas que eu tenho visto
Foi
o mais interessante.
Este
rapaz que eu falo
Residia
no sertão,
Em
Jardim do Seridó
Na
fazenda São João,
Vivia
com os seus pais
Na
mais perfeita união.
Alfredo
era seu nome
Rapaz
de tipo elegante,
Com
dezoito de idade
Ele
se fez viajante,
Da
praia para o sertão
Negociava
ambulante.
Um
dia pela manhã
Alfredo
se despediu,
Arrumou
os necessários
Fez
a partida e seguiu,
Parece
que a triste sorte
Desta
vez lhe perseguiu.
01
Ele
seguiu a viagem
Com
prazer e alegria,
Arriou
pra descansar
Às
onze horas do dia,
Na
viração do alpendre
Da
fazenda da Turquia.
Ele
arriou a bagagem
E
começou descansando,
Ouviu
pra dentro de casa
De
quando em vez soluçando,
Ele
conheceu que era
Uma
pessoa chorando.
Ele
levantou-se e disse:
Meu
Deus que quadra ferina,
Quando
disse essas palavras
Foi
chegando uma menina,
Bonita
que só o brilho
Da
estrela matutina.
Alfredo
penalizado
Disse:
o que sente menina?
Ela
respondeu chorando
Eu
sou uma peregrina,
Que
vivo aqui cumprindo
Minha
miserável sina.
02
Alfredo
disse: mocinha
Eu
sou um homem sem medo,
A
minha volta é ruim
De
mim ninguém faz brinquedo,
Diga
por que estás chorando
Me
conte lá esse enredo.
A
moça disse: senhor
Eu
choro é com razão,
Porque
meu pai é um homem
Mais
feroz que um leão,
Muitos
aqui chamam ele
O
cascavel do sertão.
Alfredo
disse: mocinha
Seu
sofrimento faz dó,
Eu
sei que sei pai é brabo
Aqui
neste Seridó,
Mas
o remédio de um doido
É
outro no mocotó.
Disse
Alfredo: se achar
Que
eu sou merecedor,
Me
responda uma palavra
Por
especial favor,
Como
se chama à senhora
Eu
quero ser sabedor.
03
Disse
ela: meu nome é Júlia
Por
apelido Julinha,
Alfredo
nesse momento
Disse
sorrindo a mocinha,
Se
queres fugir comigo
Atravesso
o fim da linha.
Se
aceitar a proposta
Desde
já fique avisada,
Para
sairmos daqui
A
uma da madrugada,
Você
fugindo comigo
Se acaba
toda zuada.
A
moça deu um suspiro
Como
quem pede um socorro,
Disse:
fujo agora mesmo
Querendo
na frente eu corro,
Mas
se meu pai for atrás
Tenho
certeza que morro.
Alfredo
disse: mocinha
Isso
é modo de dizer,
O
homem por ser valente
Não
se livra de morrer,
Quem
leva o saco pra dar
Também
leva pra trazer.
04
Alfredo
nesse momento
Mostrou
que tinha coragem,
Chegou
pra perto da moça
Disse
a ela: minha imagem,
Dê-me
um beijo até a hora
De
nós seguir a viagem.
Nisso
a moça se ausentou
Alfredo
ficou sentado,
Ninguém
na casa sabia
Do
que tinha se passado,
Ela
foi porém deixou
O
drama todo acertado.
Alfredo
ficou ali
Bastante
contrariado,
Dizendo
dentro de si
É
triste meu resultado,
Se
eu não casar com ela
Findo
meus dias enforcado.
Alfredo
a meia noite
Selou
urgente o cavalo,
A
mocinha deu o fora
Com
gosto de acompanha-lo,
Passaram
um pitu no velho
Antes
do cantar do galo.
05
Com
duas horas e meia
Saíram
numa rodagem,
Alfredo
nesse momento
Disse
para sua imagem:
Só
enfrenta um caso desses
O
homem que tem coragem.
Quando
ia rompendo a aurora
Já
amanhecendo o dia,
Alfredo
naquela estrada
Deserta
não conhecia,
Quando
chegou adiante
Encontrou
com um vigia.
Quando
o vigia viu eles
Gritou
com frases singela,
A
moça que você leva
Eu
conheço essa donzela,
Vou
levar você agora
A
presença do pai dela.
Alfredo
gritou dizendo:
Pode
vir o inimigo,
Para
eu entregar a moça
Que
eu não temo castigo,
Seca
o mar e acaba o mundo
Porém
ela vai comigo.
06
Disse
o vigia: comigo
Você
hoje se embaraça,
Eu
sou um negro valente
Que
nunca temeu desgraça,
Se
acaba o mundo porém
A
moça daqui não passa.
Alfredo
disse: é mais fácil
O
diabo gostar de vela,
Um
macaco ir à Igreja
De
palma véu e capela,
Só
quando isto acontecer
Pode
ser que eu deixe ela.
Disse
o negro: vamos ver
Quem
é que conta a história,
Alfredo
gritou: na luta
Um
de nós conta vitória,
Vamos
ver de nós dois quem
Fica
com esta em memória.
O
negro neste momento
Gritou
eu sou verdadeiro,
Primeiro
eu dou-lhe uma surra
Só
mato por derradeiro,
Alfredo
disse: moleque
Vamos
ver quem cai primeiro.
07
Alfredo
enfrentou a luta
Brigando
sem embaraço,
O
negro com meia hora
Abandonou
o cangaço,
Correu
que os mocotós
Batiam
no espinhaço.
Com
a carreira do negro
Serviu
até de gracejo,
Alfredo
gritou moleque:
Cadê
você que eu não vejo,
Homem
desta qualidade
Não
enfrenta um sertanejo.
Aqui
eu deixo Alfredo
Com
a sua deusa bela,
Vou
falar no pai da moça
Militão
Lima Portela,
Quando
amanheceu o dia
Que
não achou a donzela.
Começaram
procurando
Naquela
ocasião,
O
negro vinha chegando
Gritou
dizendo: patrão,
A
sua filha fugiu
Com
um rapaz do sertão.
08
Eu
estava na cancela
Quando
eles vinham chegando,
Júlia
de braço com ele
Muito
baixo conversando,
E eu
sem perca de tempo
Fui
logo a ele enfrentado.
Quando
eu enfrentei o moço
Faz
medo até eu dizer,
A
luta foi tão tremenda
Que
fez a terra tremer,
Eu
vi que não dava jeito
Corri
para não morrer.
O
capitão nesta hora
Disse
no meio da contenda:
Eu
vou mandar intimar
Meus
cabras de encomenda,
Vou
buscar o sertanejo
Pra
matá-lo na fazenda.
E
gritou para o vigia:
Reúna
a rapaziada,
Vá
me chamar Quinta-feira
Rouxinol
e Mão Furada,
Maribondo
e Capuxú
Ventania
e Trovoada.
09
Traga
o Negro Antonio Macho
Agrião
e José Gato,
Apolinário
da Cunha
Sebastião
e Donato,
E me
diga a João Errado
Para
vir pegar o pato.
Nisso
o vigia saiu
Fez
o convite ligeiro,
Em
menos de dez minutos
Ficou
repleto o terreiro,
Pra
todo lado se via
Esteira
de cangaceiro.
Quando
reuniu os cabras
O
capitão nessa hora,
Bateu
a mão ao seu rifle
Saltou
do lado de fora,
E
disse para os capangas
Vamos
seguir sem demora.
Vamos
prender um bandido
Que
me carregou Julinha,
Eu
pra pegar ele hoje
Vou
até o fim da linha,
Do
jeito que estou danado
Brigo
até com a murrinha.
10
Os
capangas responderam
Entre
nós não há duelo,
O
Rio Grande do Norte
Só
cria homem amarelo,
E
nós na brigada somos
A
cobra que mordeu belo.
Militão
com os seus cabras
Nesse
momento seguia,
Viajando
sem ter medo
Entrou
numa travessia,
Foram
encontrar os amantes
Ás
onze horas do dia.
Alfredo
que se achava
Junto
à beira da estrada,
Numa
sombra descansando
No
colo da sua amada,
Quando
naquele momento
Surgiu
a rapaziada.
Quando
o grupo foi chegando
Gritou
de lá um bandido,
Cabra
safado conheça
Que
seu plano foi perdido,
Siga
direto a prisão
Cabra
cretino atrevido.
11
Conheça
que está no cerco
Dos
cabras de Militão,
Não
fale não esmoreça
Siga
direto a prisão,
Nessa
voz Alfredo disse:
Morto
sim, mas preso não.
Alfredo
entrou ali
Numa
luta encarniçada,
Pegou
o revólver dele
Entregou
a sua amada,
Ficou
brigando somente
De
rasteira e cabeçada.
Alfredo
partiu afim
De
estrangular Militão,
Quando
passava a rasteira
Botava
um eito no chão,
No
soco e na cabeçada
Era
igualmente um canhão.
Julinha
também de lado
Cumprindo
o forte destino,
De
vez em quando atirava
Na
testa dum assassino,
Quando
arrastava o gatilho
Podia
bater no sino.
12
Com
meia hora de luta
Era
horrenda a multidão,
Tinha
vinte e quatro cabras
Mortos
prostrados no chão,
Só
escapou da revolta
O
valente Militão.
Depois
que Militão viu
Morrer
sua cabroeira,
Meteu
o peito no mato
Saiu
quebrando madeira,
Dum
choto que deu tirou
Quatro
léguas na carreira.
Quando
ele chegou em casa
Gritou
no meio do salão,
Eu
me encontrei com Julinha
Na
volta do grutilhão,
Fugindo
com o diabo
Em
figura de cristão.
Quando
eu falei pra ele
Dizendo
sou Militão,
Ele
partiu para mim
Mais
feroz que um dragão,
Deu-me
um soco tão danado
Quase
vomito o pulmão.
13
Entrou
na luta abaixado
Sem
nenhum acanhamento,
Na
cabeça e no soco
Brigava
que só jumento,
Eu
escapei porque uso
A
oração de São Bento.
Aqui
faço um paradeiro
Com
toda pontuação,
E na
mesma história eu digo
Dando
a discriminação,
Falando
sobre Alfredo
No
fim da revolução.
Alfredo
quando se viu
No
meio da luta sozinho,
Disse
a Julinha: seu pai
Vai
conhecer direitinho,
Para
saber que não deixo
Viagem
em meio de caminho.
Dizendo
isso voltou
Pela
mesma direção,
Atrás
de ver se encontrava
O
valente Militão,
Alfredo
dizia; eu hoje
Decido
toda questão.
14
Foi
direto a casa grande
Quando
chegou no portão,
Partiu
um lobo valente
Alfredo
pegou-lhe a mão,
Deu-lhe
um baque tão danado
Que
saltou o coração
Quando
matou o cachorro
Foi
chegando o cangaceiro,
Partiu
pra pegar Alfredo
Mas
este muito ligeiro,
De
uma queda que deu-lhe
Não
deixou um osso inteiro.
Alfredo
ficou ali
De
pronta execução,
Bateu
na porta dizendo
Aqui
tem um cidadão,
Que
deseja conhecer
O
valente Militão.
Quando
Militão saiu
Alfredo
disse: conheça,
Que
vim pedir sua filha
É
bom que não estremeça
Se
não com pouco uma bala
Visita
a sua cabeça.
15
Militão
partiu pra ele
Como
um lobo carniceiro,
Alfredo
negou-lhe o corpo
E
gritou muito ligeiro,
Velho
você hoje encontra
Tampa
pro seu tabaqueiro.
Pegou
o velho na beca
Bateu
com ele no chão,
Meteu-lhe
o punhal na boca
Gritou
no meio do salão,
Responda
velho danado
Se
me dar a moça ou não.
O
velho se viu perdido
Fez
o maior desespero,
Disse
a Alfredo: me solte
Que
eu lhe dou muito dinheiro,
Dou
a filha e a mulher
E
sirvo de travesseiro.
Casou-se Alfredo de Almeida
I teve no fim perdão,
Roubou a filha do velho
I fez a revolução,
Lutou até que venceu
O valente Militão. FIM
16
A
Vida de João Malazarte
Autor:
Luiz de Lira
Quem
nunca leu a história
Do
tal João Malazarte,
Aproxime-se
agora e ouça
O
valor da sua arte,
O
ente mais presepeiro
Conhecido
em toda parte.
Morreu
Pedro Malazarte
Porém
deixou o seu neto,
De
presepada e mentira
O
João ficou completo,
Nos
lugares onde andou
Não
ficou ninguém quieto.
João
nasceu em Lisboa
Porém
deixou Portugal,
Emigrou
para o Brasil
Quando
chegou em Natal,
Seu
pai comprou uma loja
Na
rua comercial.
Naquele
tempo Natal
Era bastante
atrasada,
Uma
cidade pequena
De
matos arrodeada,
Porém
já havia um porto
E
uma gente abastada.
01
Deixo
Natal e agora
Prossigo
noutro tratado,
Sobre
João Malazarte
Da
forma que foi criado,
Era
perverso demais
Mentiroso
e malcriado.
Devido
às trelas, João
Apanhava
todo dia,
Porém
não se emendava
No
lugar por onde ia,
Fazia
grande alvoroço
E
para casa corria.
João
Malazarte um dia
Encontrou-se
com um padre,
E
disse a bênção padrinho
Minha
mãe é sua comadre,
Mandou
eu passar o dia
Com você
na santa madre.
O
padre levou João
Porque
tinha um afilhado,
Porque
não o conhecia
Chegou
bastante cansado,
Deitou-se
na sacristia,
Ferrou
num sono pesado.
Enquanto
o padre dormia
João
se achando só,
Melou
a cara do padre
De
rouge, batom e pó,
Depois
destrancou o cofre
Tirou
dinheiro sem dó.
02
O
gato do capelão
João
pode agarrar ele,
Fez
um facho de molambo
Amarrou
na calda dele,
Ensopou
de querosene
Depois
tocou fogo nele.
O
padre estava dormindo
Não
viu João fazer nada,
Mas
o gato enguiçou ele
Com
a cauda incendiada,
Trepou-se
no altar mor
Fez
uma grande zuada.
Incendiou-se
o altar
Cobriu-se
tudo em fumaça,
João
disse: seu padre acorde
E
pule pela vidraça,
Se
não o gato lhe morde
E o
senhor se desgraça.
O
padre se acordou
Naquele
grande alvoroço,
Correu
atrás de João
Para
cortar-lhe o pescoço,
João
na frente gritava:
-- O
bom eu levo no bolso.
Na
frente João entrou
Na
casa de uma velhinha,
O
padre parou na frente
João
entrou na cozinha,
Entrou
numa capoeira
Que
por traz da casa tinha.
03
Reuniu-se
o pessoal
Pra
saber do ocorrido,
O
padre todo melado,
Cansado
e aborrecido,
Um
rapaz disse: “Seu padre”
-- O
seu rosto está tingido.
Uma
moça anarquista
Dessas
que tem no Brasil,
Perguntou
ao capelão:
--
Vai dançar hoje seu Gil,
O
senhor ainda é padre
Ou
velho de pastoril?
O
povo todo sorrindo
E o
padre encabulado,
Reparou-se
num espelho
Chorou
de envergonhado,
No
mesmo dia deu parte
Pra
João ser processado.
Seguiu
um soldado velho
A
procura de João,
Com
ordem do delegado
Para
leva-lo a prisão,
Mas
caiu numa cilada
Que
morreu do coração.
O
praça encontrou João
Pôs-se
a conversar com arte,
Ele
contente e sorrindo
Fazendo
grande descarte,
O
soldado perguntou:
--
Conheces João Malazarte.
04
João
lhe disse: Conheço
Hoje
mesmo encontrei ele,
Se
for um que o vigário
Deu
uma carreira nele,
Dê-me
um tostão que eu
Vou
mostrar a casa dele.
O
soldado que queria
Prender
e dar em João,
Deu-lhe
o tostão enganado
Com
boa satisfação,
João
recebeu e disse:
--
Eu ajeito esse ladrão.
Naquela
rua morava
Um
oficial malvado,
Um
coronel do exercito
Muito
bravo e respeitado,
João
disse: -- para lá
Vou
mandar esse quadrado.
Depois
do plano formado
Na
calçada pôs-se em pé,
Disse:
--João Malazarte
Mora
naquele chalé,
-- Naquele?
Pergunta o praça
Malazarte
disse: É!
João
lhe disse: é ali
Que
mora o cabra covarde,
Agora
eu volto daqui
Porque
já é muito tarde,
Se
eu demorar na rua
Na
peia o meu lombo arde.
05
João
voltou na carreira
E o
pobre do soldado,
Seguiu
direto ao chalé
Bastantemente
vexado,
Chegou
na porta e bateu
Com
um talento danado.
O
oficial estava
Tomando
um forte café,
Nisso
o soldado chegou
Na
porta meteu o pé,
Perguntou:
cadê o corno
Que
mora nesse chalé.
Coronel
levantou-se
Da
mesa muito abusado,
Disse
quando viu o praça
--
Eu não gosto de soldado,
Nem
devo nada a polícia
Por
ali cabra safado.
O
soldado disse: eu sei
Que
o coronel não gosta,
O
coronel disse: cale-se
Eu
não quero ouvir proposta,
Meteu
– lhe a mão pela cara
Que
ele caiu de costa.
Quando
o praça levantou-se
Recebeu
um pontapé,
Do
outro murro foi cair
Na
calçada do chalé,
Com
a cara ensanguentada
Correu
deixou o boné.
06
Chegou
na delegacia
Disse
para o delegado:
--
Apanhei que quase morro
Não
quero mais ser soldado,
O
senhor mesmo que vá
Prender
aquele danado.
João
vendo o delegado
O
perseguindo demais,
Embarcou
pra Pernambuco
E
quando saltou no cais,
Seguiu
por ali chorando
Com
saudade dos seus pais.
Um
policial viu João
Num
choro tão desmedido,
Dirigiu-se
e perguntou
Se
ele andava fugido,
João
disse: não senhor
Choro
com dor de ouvido.
-- E
você aonde mora?
João
respondeu com tédio,
--
Se quer saber quem eu sou
Vá
ali naquele prédio,
Que
eu vou para a farmácia
Comprar
pra mim um remédio.
Nisso
João Malazarte
Numa
marcha continua,
Dizendo:
não me interrompa
Com
essa besteira sua,
O
meu pai disse que eu
Não
demorasse na rua.
07
O
guarda disse: seu corno
Está
com malcriação,
João
lhe disse: respeite
O
filho de um barão,
Se
eu contar ao meu pai
Você
vai para a prisão.
O
guarda ficou com medo
Deixou
João ir embora,
No
fim da Rua João
Encontrou
uma senhora,
Disse:
a benção minha tia
Como
vai? Aonde mora?
A
mulher disse: estou boa
Moro
ali numa choupana,
João
disse; eu vou agora
Conhecer
sua cabana,
E
também com a senhora
Eu
vou passar a semana.
A
mulher tinha um sobrinho
Parecido
com João,
Morava
no cariri,
Na
fazenda do grotão,
Levou
ele para casa
Chamando-o
Sebastião.
A
mulher era viúva
Tinha
uma filha mocinha,
João
perguntou: titia
Como
se chama a priminha.
A
velha disse: menino
Essa
não é Teresinha!
08
Depois
da ceia a viúva
Perguntou:
Sebastião,
O
teu pai ainda é dono
Da
fazenda do grotão?
João
disse: e ele vende
Aquela
situação!
Ele
fez uma Igreja
No
pé de um grande monte,
Um
jardim e um banheiro
No
pé duma grande fonte,
No
jardim tem uma estátua
Apontando
o horizonte.
Quando
vem rompendo o dia
Que
a passarada canta,
Surge
uma grande alegria
Todo
povo se levanta
E
pra adorar o Santo
Vai
a igrejinha santa.
Quando
João se calou
Perguntou-lhe
Teresinha,
--
Sebastião tu me leva
Pra
eu ver a igrejinha,
E
também passar uns dias
Com
minha prima Julinha!
João
lhe disse; pois não
Estou
pronto pra levar,
Se
titia consentir
Você
pode se arrumar,
A
velha disse: eu consinto
Nele
eu posso confiar.
09
João
consigo dizia:
-- A
garota é bonitinha,
A
velha é besta demais
Pensa
que é tia minha,
Presta
confiança a mim
Eu
ajeito essa bichinha.
A
mulher disse a João
Quando
ele foi embora:
--
Você leve Teresinha
Porém
volte sem demora,
Só
passe por lá um mês
João
disse: sim senhora!
João
largou-se no mundo
Com
destino ao sertão,
Foi
parar em Vila Bela
Isso
sem um tostão,
Lá
empregou Teresinha
Para
apanhar algodão.
Passou
o resto do ano
Teresinha
não voltou,
A
mãe dela impaciente
Para
a fazenda rumou,
Deu
a jornada perdida
Porque
não a encontrou.
A
irmã disse: meu filho
Da
fazenda não saiu,
Foi
outro Sebastião
Que
a você iludiu,
Porém
o meu filho não
Quem
disse isso mentiu.
10
A
pobre voltou chorando
E disse:
aquele sujeito,
Me
carregou Teresinha
E
faltou-a com respeito,
Chegando
em casa deu parte
A um
juiz de direito.
Ela
contou ao juiz
Tudo
quanto foi passado,
Como
João Malazarte
A
ela tinha enganado,
Devido
aquela lazeira
O
juiz falou zangado.
A
senhora é a culpada
Pois
deu a moça ao rapaz,
Quem
é besta deste jeito
Sofre
desta e outras mais,
Depois
da desgraça feita
Você
mesma vá atrás.
-- O
caso está resolvido
Disse
o juiz de direito,
--
Va arranjar outra filha
Aquela
não tem mais jeito,
Ou
então vá atrás dela
Pra
toma-la do sujeito.
A
viúva foi pra casa
Muito
triste envergonhada,
Além
de perder a filha
Sofreu
mais essa massada,
Com
o desgosto morreu
Numa
corda pendurada.
11
Agora
o leitor se lembra
Da
moça lá no sertão,
Já
tinha perdido a honra
Estava
na perdição,
Levou
o caso a policia
Mandaram
prender João.
João
com medo correu
Deixou
Teresinha só,
Seguiu
por ali cortando
As
zonas do Piancó,
Atravessou
Paraíba
Foi
sair no Seridó.
Chegou
no Seridó liso
Não
tendo do que viver,
Arranjou
umas pimentas
E
foi pra feira vender,
Porém
no caminho fez
Um português
se morder.
Encontrou
um português
Com
um jumento acuado,
Carregado
com panelas
Sobre
o caminho parado,
O
português dando nele
E o
burro emperrado.
João
disse: camarada
Eu
tenho remédio aqui,
Deu-lhe
as pimentas dizendo:
--
Como este eu nunca vi,
Esfregue
no fundo dele
Depois
puxe - o por ali.
12
Ele
passou as pimentas
No
lugar que João mandou,
O
jumento deu dois coices
Que
a cangalha virou,
Que
as panelas quebraram
E o
burro desembestou.
João
disse ao português
-- O
jumento já correu,
Com
o remédio no fundo
Ele
desapareceu,
E
você só pega ele
Se
também passar no seu.
O
pobre do português
Para
pegar o jumento,
Passou
a pimenta ardosa
No
lugar que sai o vento,
João
disse: oh! cabra besta
Desgraçaste
o fedorento.
Quando
o português sentiu
O
ardor no fiofó,
Puxou
a faca da cinta
João
disse: fique só,
Duma
carreira que deu
Foi
parar em Mossoró.
Chegou
em uma fazenda
Perguntou
ao fazendeiro,
Se
lhe arranjava um emprego
Nem
que fosse de vaqueiro,
Pela
comida e a roupa
E
também algum dinheiro.
13
Perguntou-lhe
o fazendeiro:
-- O
senhor de onde vem,
Respondeu
João Malazarte:
-- O
senhor perguntou bem,
Venho
do oco do mundo
Sou
filho de muito além.
Hoje
eu estou por aqui
Mas
nasci em Portugal,
Na
Capital de Lisboa
Porém
o meu pessoal,
Emigrou
para o Brasil
Eu
me criei em Natal.
Aprendi
ler e contar
Tenho
arte com fartura,
Mas
estou desempregado
Sofrendo
grande amargura,
Disse
o fazendeiro: agora
Gozarás
grande aventura.
Você
aqui tem direito
A um
conforto necessário,
Como
administrador
Vai
ser o meu mandatário,
Tem
almoço janta e ceia
Dormida
e um bom salário.
João
ficou manobrando
Aquela
propriedade,
Passou
dois anos quieto
Sem
fazer perversidade,
Já
gozava do patrão
A
maior intimidade.
14
Porém
satanás um dia
Manifestou-se
em João,
Ele
armou uma cilada
Para
a filha do patrão,
Ela
por ser inocente
Caiu
no laço do “cão”
João
disse: Madalena
Seu
pai por seu meu amigo,
Mandou
dizer que você
Dormisse
um sono comigo,
Ela
foi porque pensou
Que
não corria perigo.
A
patroa de João
Estava
lá na cozinha,
E
não viu quando os dois
Entraram
na camarinha,
Ele
dormiu a vontade
Com
todo prazer que tinha.
Ainda
estava deitado
O
fazendeiro chegou,
A
moça gritou do quarto
Com
João aqui estou,
Cumprindo
com meu dever
Como
o senhor ordenou.
O
velho conheceu logo
Que
era uma traição,
Deu
um pontapé na porta
Que
ela rolou no chão.
João
correu de cueca
E a
moça de camisão.
15
O
velho correu atrás
Adiante
os agarrou,
Disse:
vão morrer sabendo
Pelo
punhal arrastou,
João
gritou: ora cebo
Foi
ela que me chamou!
Com
essa voz o patrão
Mandou-lhe
um soco direto,
João
rodopiou e caiu
Dizendo:
seu Anacleto,
Não
me mate por favor
Deixe-me
criar seu neto!
A
mulher disse: meu velho
Você
não mate João,
Se a
menina ficar
Perdida
sem cotação,
João
disse: eu só caso
Porque
comi o pirão.
O
velho se convenceu
Depois
do serviço feito,
Fez
depressa o casamento
E o
juiz de direito,
Disse:
-- João vá viver
Com
ela bem satisfeito. FIM
16
HISTÓRIA
DE BARBA AZUL
Autor:
HEITOR ATHAYDE
HOUVE
nos tempos feudais
Um
opulento barão,
Mais
rico que um nababo
Malvado
de profissão,
Prendia
por brincadeira
Matava
por distração.
Era
horroroso e feio
Tinha
o corpo de um gigante,
A
barba grande e azul
Que
monstro repugnante,
Uma
cabeleira imunda
E um
olhar penetrante.
Chamava-se
Barba Azul
Por
ele ser muito ruim,
Tinha
um coração de Nero
E a alma
de Caim,
De
vinte e tantas esposas
A
todas elas deu fim.
01
O
fim de suas esposas
Era
ali desconhecido,
E o
médico não dizia
De
que tinha adoecido,
Ninguém
sabia na corte
Como
elas tinham morrido.
Ainda
não satisfeito
De
ter tão barbaramente,
Dado
fim a vinte esposas
Como
assassino imprudente,
Foi
seduzir uma moça
Para
mata-la inocente.
Habitava
perto dele
A
uma certa lonjura,
Uma
moça muito pobre
Porém
rica em formosura,
Ela
se chamava Helena
E
vivia de costura.
Barba
Azul falava só
Quando
tinha enviuvado,
Dizendo:
que asneira minha
Eu
podia está casado,
Vou
arranjar uma moça
Saiu
por ali vexado.
02
Andando
pela cidade
Na
casa de Helena entrou,
Foi
logo dizendo a moça
Tudo
quanto ele pensou,
Depois
dirigiu-se a velha
Por
esta forma falou:
--
Senhora eu venho aqui
Por
amor duma donzela,
Não
obstante ser pobre
Mas eu
agrado-me dela,
Quero
saber se a senhora
Consente
eu casar com ela.
A
velha disse ao barão
Que
tal coisa não fazia,
Dar
a filha aquele monstro
Ela
nunca pensaria,
A
moça por sua vez
Disse
que não lhe queria.
Ele
não desanimou
Fazendo-lhe
muito agrado,
Barba
Azul para Helena
Tornou-se
quase um criado,
Os
seus vassalos diziam:
O
barão está dominado!
03
Vendo
ele que a moça
Nutria
pouca vontade,
Procurou
alguns amigos
De
maior intimidade,
Pra
fazer com que Helena
Chegasse
a ter-lhe amizade.
Levando
ela pra festas
Piqueniques
e folguedo,
Todo
dia no castelo
Ele
inventava um brinquedo,
Mandava
chamar Helena
Mas
ela ia com medo.
Dizia
Helena consigo:
Se
fosse um belo rapaz,
Que
fizesse isso comigo
Era
bom sermos iguais,
Porém
um monstro daquele
Eu
acho feio demais!
Depois
Helena dizia:
Eu
já não acho horroroso,
Como
me dizia o povo
Que
era um monstro assombroso
Só
por ter a barba azul
Não
é tão defeituoso!
04
Disse
Helena: à sua mãe
Eu
tenho cá para mim,
Que
um homem como aquele
Como
pode ser ruim?
Na
tarde do mesmo dia
Ela
mandou dar-lhe o sim.
Barba
Azul com a notícia
Quase
morre de alegria,
Mandou
logo convidar
O
povo que conhecia,
Aprontando
quase tudo
Antes
de findar-se o dia.
No
semblante do barão
Se
via grande mudança,
Todo
o povo da cidade
Sabendo
dessa aliança,
Tinha
um riso em cada rosto
Cada
riso uma esperança.
O
barão no seu castelo
Vivia
sempre arrumado,
Pois
já era vinte vezes
Que
ele tinha se casado.
Mandou
avisar ao povo
Para
o dia do noivado.
05
Foi
marcado o casamento
Para
a véspera do Natal,
Deu
Barba Azul nesse dia
Um
banquete colossal,
E
foi morar com a esposa
Num
palácio de cristal.
Ficou
Barba Azul vivendo
Com
sua esposa fiel,
Inda
não tinha mostrado
O
seu coração cruel,
Porque
ainda se achava
Em
plena lua de mel.
Toda
vez que ele casava
Uma
viagem fazia,
Não
era por muito tempo
Mas
era por mais de um dia,
Somente
para saber
A
mulher que possuía.
Em
menos dum mês passado
Despediu
do castelão,
Dizendo
para a esposa:
Deixo
as chaves em tua mão,
Chamou
ela para a sala
Foi
dar uma explicação.
06
Chegou
no salão mostrou-lhe
As
chaves que pertencia,
--
Guarde elas com cuidado
Até
que eu volte outro dia,
Aqui
tem a pequenina
Da
porta da galeria.
--
Aposentos do castelo
Todos
eles pode abrir,
Se
abrir a galeria
Sem
ninguém te consentir,
Verás
o meu ódio eterno
Quanto
vai te perseguir.
Ela
promete ao marido
Que
muito observaria,
Tivesse
pouco cuidado
Que
sua ordem cumpria,
Seguisse
sua viagem
Que
seu gosto ela fazia.
Terminando
estas palavras
O barão
lhe abraçou,
E
dando adeus a esposa
Vinha
um carro ele tomou,
Barba
Azul então partiu
A
pobre Helena ficou.
07
Uma
irmã de Helena
Com
ela também vivia,
Depois
de seu casamento
Foi
logo no outro dia,
O
barão não importava
Pra
lhe fazer companhia.
Tinha
Helena dois irmãos
Oficiais
da marinha,
Sabendo
do casamento
Da
sua bela irmãzinha,
Mandaram
dizer por carta
Qual
era o dia que vinha.
Logo
que o barão saiu
Suas
amigas visitavam,
O
castelo de Helena
Sua
sorte invejavam,
Na
riqueza de Helena
Era
em que elas falavam.
Tanto
pediram a Helena
Que
a pobre moça deixou,
Virando
peças por peças
Em
todo quarto ela entrou,
Chegando
na galeria
Aí
Helena parou.
08
Ali
as moças pararam
Cada
qual que perguntasse,
Helena
não respondia
Se
era bom que entrasse,
Resolveu
entrar depois
Que
o povo se retirasse.
Quando
a visita saiu
Helena
ficou sozinha,
Viu
alguém no corredor
Mas
era Ana que vinha,
Convidou
abrir a porta
Pra
ver no quarto o que tinha.
Quando
ela abriu a porta
Quase
que perde a razão,
Encontrou
vinte cadáveres
Espalhado
pelo chão,
Conheceu
logo que eram
As
esposas do barão.
Olhando
aquele estandarte
Ficou
quase esmorecida,
De
ver as vinte infelizes
Que
ali perderam a vida,
Disse
para a sua irmã:
Conheço
que estou perdida!
09
Helena
se lastimava
Morta
de medo coitada,
Depressa
trancou a porta
E
saiu muito vexada,
Na
sala viu que a chave
Toda
estava ensanguentada.
Ela
vendo a chave suja
Pegou
ela e foi lavar,
Mas
o sangue era pegado
Não
houve jeito largar,
Porque
a chave era mágica
Não
podia se limpar.
Helena
em limpar a chave
Era
só em que se ocupava,
Noutro
serviço da casa
Muito
pouco trabalhava,
Quanto
mais ela brunia
Mais
suja ela ficava.
Quando
Barba Azul chegou
A
pobre Helena fingia,
Que
estava muito contente
Porém
não tinha alegria,
Vendo
que sua desgraça
Talvez
fosse nesse dia.
10
O
barão chegando à sala
Helena
o cumprimentou,
Disse
ele: quero as chaves
Onde
a senhora guardou?
Ela
foi buscar as chaves
Em
dois minutos voltou.
Helena
lhe deu as chaves
Quase
morta de agonia,
As
chaves eram encantadas
Ela
de tudo sabia,
Disse
a ela: falta uma
Da
porta da galeria.
Gritou
ela: quero a chave
Helena
saiu ligeiro,
Dizendo:
vou ver se encontro
Debaixo
do travesseiro,
Ele
gritava na sala
Pior
que um cangaceiro.
Helena
trouxe-lhe a chave
De
medo vinha gelada,
Barba
Azul vendo a chave
Vinha
toda ensanguentada,
Deu
um berro e perguntou
Onde
andou esta danada?!
11
--
Helena que sangue é esse
Que
vejo a chave tingida?
Tanto
que recomendei-te
Na hora
da despedida,
Teu
crime não há perdão
Tens
meia hora de vida!
Helena
desfalecida
Nem
pode se defender,
Olhando
pra Barba Azul
Que
só fazia dizer,
Faz
ato de contrição
Te
apronta para morrer.
Vendo
ela que seu crime
Não
podia ter perdão,
Pediu
de joelhos chorando
Dê-me
licença barão,
Que
eu viva mais uma hora
Para
fazer oração.
Barba
Azul inda cedeu
Os
tristes rogos de Helena,
Até
os brutos choravam
Com
aquela penosa cena,
O
próprio Judas se visse
Daquilo
teria pena.
12
Helena
sobe a escada
Pra
fazer uma oração,
Depois
ouviu uma zuada
Pior do que um trovão,
Era
Barba Azul roncando
Lá
embaixo no salão.
Enquanto
Helena rezava
Perguntava
soluçando:
Oh!
Ana não vês ninguém
Pela
estrada passeando,
Disse
a outra: estou ouvindo
O
Barba Azul te chamando.
Inda
perguntou Helena:
Não
vês ninguém na estrada?
Disse
Ana: eu estou olhando
Com
a vista já cansada,
Só
vejo a vasta campina
O
campo verde e mais nada.
Nisso
gritou Barba Azul:
Desça
mulher desgraçada,
Já
estou sem paciência
Não
espero mais por nada,
Nem
Deus te livra da morte
A
tua hora é chegada.
13
Disse
Helena a sua irmã:
Reparas
se vem alguém,
Diz
Ana: vejo dois vultos
Que
se avista muito além,
Se o
espírito não me engana
São
nossos irmãos que vem.
Barba
Azul colerizado
De
raiva quase não fala,
Com
os gritos estremecia
Até
o forro da sala,
--
Vem logo mulher infame
Se
não vier vou busca-la!
A
pobre reconhecendo
Que
não podia viver,
Os
gritos do assassino
Lhe
obrigavam descer,
Desceu
para os pés do monstro
Já
pronta para morrer.
Chegando
aos pés do monstro
Botou
os joelhos ao chão,
Dizendo:
senhor eu sei
Que
não alcanço o perdão,
Mas
quero ver minha mãe
Para
tomar-lhe a benção.
14
Barba
Azul ergueu o punhal
Que
na sua mão trazia,
Dizendo:
tua morada
É
dentro da galeria,
Junto
as outras que estão lá
Pra
lhes fazer companhia.
Antes
do braço descer
Ouviu
bater no portão,
Com
a força tão horrenda
Que a
porta rolou no chão,
Eram
os dois irmãos de Helena
Em
procura do barão.
O
barão ficou suspenso
Sem
coragem pra descer,
Na
frente dos dois cunhados
Começou
logo a tremer,
Vendo
que morria mesmo
Abriu
da perna a correr.
Os
dois rapazes seguiram
No
encalço do barão,
Barba
Azul não reagiu
Faltou-lhe
a disposição,
Adiante
pegaram o monstro
Deram
com ele no chão.
15
Agarraram
Barba Azul
Na
hora que o prenderam,
Sangraram
ele na goela
Que
todas as veias romperam,
A
raiva era tão grande
Que
até o sangue beberam.
Voltaram
para o palácio
Cheios
de satisfação,
Depois
que já tinham feito
A
carniça do barão,
Descansando
a pobre Helena
Daquele
infeliz dragão.
O
mal por si se destrói
Porque
a culpa condena,
Da
morte de Barba Azul
Ali
ninguém teve pena,
Louvaram
toda a ação
Dos
moços irmãos de Helena.
Helena
ficou vivendo
Em
seu palácio garboso,
Imensamente
feliz
Tendo
outro como esposo,
O
monstro morreu deixando
Ressaibo
dum criminoso. FIM
16